Primeiro papa sul-americano e jesuíta da história, Francisco deixa um legado de humildade, reformas e aproximação da Igreja com os mais pobres.
Morreu nesta quinta-feira (11), aos 88 anos, o Papa Francisco, líder da Igreja Católica desde 2013. O pontífice faleceu no Vaticano após complicações respiratórias agravadas por seu histórico de problemas pulmonares, segundo nota oficial do Vaticano. A morte de Francisco encerra um dos papados mais marcantes da era moderna, caracterizado por gestos de humildade, abertura ao diálogo inter-religioso e posicionamentos firmes em temas sociais e ambientais.
Nascido Jorge Mario Bergoglio, em Buenos Aires, Argentina, em 17 de dezembro de 1936, ele ingressou na Companhia de Jesus em 1958 e foi ordenado sacerdote em 1969. Em 1992, tornou-se bispo auxiliar de Buenos Aires e, seis anos depois, arcebispo da capital argentina. Em 2001, foi nomeado cardeal pelo Papa João Paulo II. Com uma trajetória discreta, mas firme, ganhou respeito por seu trabalho junto aos pobres nas periferias de Buenos Aires.
Em 13 de março de 2013, foi eleito papa, tornando-se o primeiro jesuíta e o primeiro latino-americano a assumir o trono de Pedro. Adotou o nome Francisco em homenagem a São Francisco de Assis, símbolo da simplicidade e da defesa dos mais humildes — virtudes que ele buscou colocar em prática desde o primeiro dia de seu pontificado.
Ao longo de 12 anos como chefe da Igreja Católica, Francisco promoveu importantes reformas na Cúria Romana, defendeu os imigrantes, denunciou as injustiças sociais, abordou com coragem temas polêmicos como a união de casais homoafetivos, mudanças climáticas e abusos dentro da Igreja. Recusou-se a morar nos luxuosos aposentos papais, optando pela residência simples da Casa Santa Marta.
Francisco também foi uma figura central no cenário internacional, mediando tensões diplomáticas e promovendo a cultura da paz. Com sua voz firme e ao mesmo tempo acolhedora, cativou fiéis ao redor do mundo — inclusive fora da Igreja.
Seu legado será lembrado como o de um papa que, com palavras simples e gestos poderosos, buscou aproximar a Igreja das pessoas, especialmente das que mais sofrem. Francisco deixa um exemplo duradouro de fé, coragem e humanidade.
íntegra da homilia da Missa de Páscoa e da bênção Urbis et Orbi, ambas escritas pelo pontífice e lidas por cardeais neste domingo (20).
Homilia de Páscoa
Maria Madalena, ao ver que a pedra do sepulcro tinha sido removida, começou a correr para ir avisar Pedro e João. Também os dois discípulos, tendo recebido aquela surpreendente notícia, saíram e – diz o Evangelho – «corriam os dois juntos» (Jo 20, 4). Os protagonistas dos relatos pascais correm todos! E este “correr” exprime, por um lado, a preocupação de que tivessem levado o corpo do Senhor; mas, por outro lado, a corrida de Maria Madalena, de Pedro e de João fala do desejo, do impulso do coração, da atitude interior de quem se põe à procura de Jesus. Ele, com efeito, ressuscitou dos mortos e, portanto, já não se encontra no túmulo. É preciso procurá-lo noutro lugar.
Este é o anúncio da Páscoa: é preciso procurá-lo noutro lugar. Cristo ressuscitou, está vivo! Não ficou prisioneiro da morte, já não está envolvido pelo sudário e, por isso, não podemos encerrá-lo numa bonita história para contar, não podemos fazer dele um herói do passado ou pensar nele como uma estátua colocada na sala de um museu! Pelo contrário, temos de O procurar, e, por isso, não podemos ficar parados. Temos de nos pôr em movimento, sair para O procurar: procurá-lo na vida, procurá-lo no rosto dos irmãos, procurá-lo no dia a dia, procurá-lo em todo o lado, exceto naquele túmulo.
Procurá-lo sempre. Porque se Ele ressuscitou, então está presente em toda a parte, habita no meio de nós, esconde-se e revela-se ainda hoje nas irmãs e nos irmãos que encontramos pelo caminho, nas situações mais anónimas e imprevisíveis da nossa vida. Ele está vivo e permanece sempre conosco, chorando as lágrimas de quem sofre e multiplicando a beleza da vida nos pequenos gestos de amor de cada um de nós.
Por isso, a fé pascal, que nos abre ao encontro com o Senhor ressuscitado e nos dispõe a acolhê-lo na nossa vida, é tudo menos uma acomodação estática ou um pacífico conformar-se numa segurança religiosa qualquer. Pelo contrário, a Páscoa põe-nos em movimento, impele-nos a correr como Maria de Magdala e como os discípulos; convida-nos a ter olhos capazes de “ver mais além”, para vislumbrar Jesus, o Vivente, como o Deus que se revela e ainda hoje se torna presente, nos fala, nos precede, nos surpreende. Como Maria Madalena, podemos fazer todos os dias a experiência de perder o Senhor, mas todos os dias podemos correr para O reencontrar, sabendo com certeza que Ele se deixa encontrar e nos ilumina com a luz da sua ressurreição.
Irmãos e irmãs, aqui está a maior esperança da nossa vida: podemos viver esta existência pobre, frágil e ferida agarrados a Cristo, porque Ele venceu a morte, vence a nossa escuridão e vencerá as trevas do mundo, para nos fazer viver com Ele na alegria, para sempre. Em direção a esta meta, como diz o Apóstolo Paulo, também nós corremos, esquecendo o que fica para trás e vivendo orientados para o que está à nossa frente (cf. Fl 3, 12-14). Apressemo-nos então a ir ao encontro de Cristo, com o passo ligeiro de Maria Madalena, Pedro e João.
O Jubileu convida-nos a renovar em nós mesmos o dom desta esperança, a mergulhar nela os nossos sofrimentos e as nossas inquietações, a contagiar aqueles que encontramos no caminho, a confiar a esta esperança o futuro da nossa vida e o destino da humanidade. Por isso, não podemos estacionar o nosso coração nas ilusões deste mundo, nem fechá-lo na tristeza; temos de correr, cheios de alegria. Corramos ao encontro de Jesus, redescubramos a graça inestimável de ser seus amigos. Deixemos que a sua Palavra de vida e verdade ilumine o nosso caminho. Como dizia o grande teólogo Henri de Lubac, «bastar-nos-á compreender isto: o cristianismo é Cristo. Verdadeiramente, não há nada mais do que isso. Em Cristo temos tudo» (Les responsabilités doctrinales des catholiques dans le monde d’aujourd’hui, Paris 2010, 276).
E este “tudo”, que é Cristo ressuscitado, abre a nossa vida à esperança. Ele está vivo e ainda hoje quer renovar a nossa vida. A Ele, vencedor do pecado e da morte, queremos dizer:
«Senhor, nesta festa, pedimos-vos este dom: que também nós sejamos novos para viver esta perene novidade. Afastai de nós, ó Deus, a poeira triste da rotina, do cansaço e do desencanto; dai-nos a alegria de acordar, a cada manhã, com os olhos maravilhados, para ver as cores inéditas daquele amanhecer, único e diferente de todos os outros. […] Tudo é novo, Senhor, e nada repetido, nada envelhecido» (A. Zarri, Quasi una preghiera).
Irmãs, irmãos, na maravilha da fé pascal, trazendo no coração todas as expetativas de paz e libertação, podemos dizer: Convosco, Senhor, tudo é novo. Convosco, tudo recomeça.