Romaria ao TCE: quando o zelo é seletivo e a pressa tem sobrenome

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Por Ivaldo Lima

Na próxima quarta-feira, 23 de abril, o Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCE-PB) promete casa cheia — não por algum tema urgente de interesse público, mas graças a uma romaria de deputados estaduais liderada pelo presidente da Assembleia Legislativa, Adriano Galdino. O motivo da peregrinação? A sessão que julgará a indicação de sua filha, Allana Galdino, para o cargo de conselheira da Corte.

A convocação foi feita com fervor pelo próprio pai-cabo-eleitoral-de-plenário, via WhatsApp. Às 9h em ponto, todos os nobres parlamentares devem estar devidamente posicionados no TCE, como quem comparece a uma missa solene. Faltou só combinar o uso de velas e hinos para completar a liturgia.

É bonito de ver quando a classe política se une com tamanha disposição. Pena que essa energia toda não se repete quando o assunto são as contas do ex-governador Ricardo Coutinho. Reprovadas pelo próprio TCE nos exercícios de 2016, 2017 e 2018, as contas seguem repousando em paz nos escaninhos da Assembleia Legislativa — sem vigília, sem romaria, e, claro, sem julgamento.

O conselheiro Fernando Catão já até implorou, em 2022, que a Assembleia fizesse sua parte e julgasse as contas pendentes, algumas há anos esperando uma análise. Mas parece que, quando não há laços de sangue ou interesses diretos envolvidos, o zelo institucional tira folga.

A pergunta que inquieta qualquer cidadão minimamente atento é: estariam os deputados indo ao TCE para acompanhar democraticamente o julgamento, ou para lembrar à Corte, sutilmente e em massa, quem é que bate ponto nas indicações de conselheiros? Afinal, uma aparição assim tão numerosa e bem sincronizada de parlamentares não costuma ser gratuita.

Seria mesmo uma coincidência inocente ou a materialização, em carne e terno, da famosa “pressão institucionalizada”? Será que no roteiro da romaria, além do trajeto até o plenário, não haveria também um certo “clima” a ser criado?

No fim, o que vemos é uma classe política ágil quando lhe convém e letárgica quando o interesse é coletivo. Fica o recado aos eleitores: talvez esteja na hora de fazer nossa própria romaria — às urnas — para reavaliar quem realmente merece estar no altar do poder.

Em tempo: Felizmente, a jurisdição da Assembleia Legislativa ainda não se estende até o Vaticano. Porque, se dependesse do fervor com que os deputados defendem a nomeação de Allana Galdino, não seria surpresa se exigissem vaga no Conclave — com direito a voto, véu, e talvez até fumaça branca, desde que a escolha fosse a indicação deles.

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